Realidade Cênica

25/05/09 - Sobe o pano. Hoje começamos a falar do realismo, mas não sem antes as considerações gerais tão interessantes que permeiam nossas aulas.

Aliás, nos relatórios das aulas prefiro mesmo me deter nas considerações gerais que no tema propriamente disso, isso porque os temas estão pontualmente registradas na apostila e nos livros da história do teatro, as considerações do professor são história fresquinha, vinda direta do forno. Inclusive noto uma mania ou um padrão na maneira como os gestores do Sesc se colocam em público na seguinte frase "Quero deixar aqui registrado..." sempre que vão falar alguma coisa, começam com a fase célebre, me pergundo, por que? Não creio que verei resposta.

Comçamos com puxões de orelha em relação à nossa leitura, semana que vem leremos "A gaivota", de Tchekov (acho que escrevi o nome dele certo, se não, deixo aqui registrada minha ignorância) para que essa leitura não seja enfadonha, como foram outras.

Estavámos todos muito nervosos com a apresentação de Grotowski no dia seguinte e passamos mais um tempo com Neemias tentando nos acalmar. E aqui vai uma consideração básica:

Eu sei que "Lab. de Interpretação I" deveria ser só Stanislavski. Dito isso é o seguinte: Mesmo que a escola Sesc tente preservar um certo 'academismo' é preciso admitir se há algum 'academismo', também falta algum. O interessante da diversidade entre cada professor não é a disciplina que eles ensinam, mas a pessoa em si, suas preferências, suas manias e generosidades, a maneira como ela encara o trabalho teatral e como ele influenciou sua vida.

Assim defendo com unhas e dentes a iniciativa de André de nos mostrar o seguinte: Eu nunca farei Stanislavski, nem Artaud, nem Grotowski, eu só farei Diogo Testa porque eu sou Diogo Testa. É importante estudar e conhecer o máximo possível. Mas o que passou é fonte, não fôrma. André nos pediu experimentos e nos quisemos dar espetáculo, outra lição importantíssima aí: Humildade, aceitação dos erros. Nosso medo de fazer 'errado' as cenas de André quase nos consumiu, e André veio para nos dizer 'não existe errado, existe teatro, e tentar já vale muito' esse tipo de conhecimento não tem preço.

Falando em realismo e mais precisamente em Tchekov uma das reflexões que tenho feito acerca é a frase do próprio é "escrevia Voudevilles e Stanislavski as transformava em dramas psicológicos" essa reflexão faço acerca da importância do encenador.

Assim como Stan, Grotowski transformou "Fausto" de Goethe, texto romântico, na sua própria estética, o galpão transformou Romeu e Julieta em teatro de rua. Zé Celso meche em tudo que toca, Antunes transformou as comédias de Nelson Rodrigues em peças míticas e as míticas em mais míticas ainda. Aí quando Neemias diz - o documento mais importante é o texto, eu penso 'cuidado'. Tudo bem que Neemias não fala do texto sem preconceitos. Ele sempre dá detalhes e características pontuais que identificam as montagens do período.

Não adianta, essa é minha reflexão, pensar teatro dramaturgia, na nossa contemporaneidade, ou pós-contemporaneidade ou seja lá o que for é claro que a dramaturgia é uma ferramenta na mão dos 'montadores', sejam eles atores, diretores ou ambos. E era sim desde sempre, só não tinha os nomes que tem hoje e pronto.

Não me recordo mais por qual motivo, mas durante a aula nos perguntamos: O que é kichute? Segundo a Wikipedia "Kichute é um calçado, misto de tênis e chuteira, produzido no Brasil desde a década de 70 ".

Uma das coisas que me chama a atenção no teatro do período é a relação universal x temporal, principalmente pelos textos de Tchekov e Ibsen. Isso também acontece em Shakespeare e nas tragédias gregas, mas volta com força aqui. No homem comum, não nos heróis históricos, como era antes, reside o que fala a todos, mesmo que ele seja colocado em uma situação do espaço/tempo que fale da situação social da platéia. A gaivota mesmo, enquanto existir teatro terá sua força. Jardim das Cerejeiras enquanto houver uma classe dominante e uma dominada e assim por diante.

De novo, em algum ponto da aula que ninguém sabe bem ao certo como, caímos na telenovela. Neemias diz que é bom usá-la como exemplo pontual porque todos conhecem a telenovela brasileira, portanto algo perto dos alunos. Verdade, acho difícil que um brasileiro, em algum ponto da vida não tenha contato com a telenovela produzida no país. Mentira, porque não acho algo proximo da maioria dos alunos. Entre faculdades, empregos e a Escola Sesc, acho difícil que existam muitos na turma que assistam telenovelas, portanto nem tão próximo. Desconfio, e faço esse comentário com certa maldade. Que as telenovelas estão mais próximas do professor que dos alunos. Não sei, posso estar enganado.

Mas sim, a telenovela chegou porque ela, em sua concepção cênica se aproxima muito do realismo no quesito que procura imitar com o máximo de fidelidade a vida real. Depois migrou para a acepção de telenovela como 'produto cultural', sujeito à tensões do mercado e da arte ao mesmo tempo. E daí começamos a discutir 'merchan', como chamam os Barbixas, grupo de comediantes constantemente evocado por Beto, Tiago, Mauro e Vila; da teledramaturgia brasileira, chegamos a imaginar um cenário onde não haveriam mais comerciais entre os programas, um cenário onde a propaganda já estaria tão culturalmente enraiazada na programação da TV que elas seriam simbiotícas, e não complementares, como são hoje.

Quanto à essa história de imitar a realidade com fidelidade ferrenha, Neemias também citou a peça "um sábado em 30" encenada pelo TAP aqui em Pernambuco. O texto tem traços muito fortes de racismo, e um casal de negros que assistia a uma apresentação saiu do espetáculo se julgando pessoalmente ofendido.

É isso, o negócio é esperar até semana que vem, a leitura.

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