O sol e a Janela

13/05/09 - Sobe o pano no Barreto Junior. É a peça de nossa queridíssima professora Evânia Copino, "quando o sol vem a janela", da Trupe Cara e Coragem, direto do Cabo de Sto. Agostinho. Direção e dramaturgia de Luiz de Lima Navarro, direção musical de Zé Caetano e Evânia Copino (oh) e Nice Albano no elenco.

O espetáculo é baseado na história da mãe de Luiz, o diretor, que tem a doença de alzheimer. Na dramaturgia as personagens são Guida, interpretada por Evânia, que tem a doença e Amélia, interpretada por Nice Albano, mulher de Guida, que cuida da enferma e busca desenterrar-lha as lembranças em seus últimos momentos.

Não é porque Evânia é minha professora não, é porque eu achei lindo e me comovi com o espetáculo. É curtinho, uns quarenta minutos de extrema delicadeza em que as duas atrizes, falam, entrecortado a lindas canções de todos os tempos e lugares, o imprescindível.

A cena procura retratar as quatro fases da doença, a saber:

1- perda de memória recente, desvio de atenção, apatia.

2- agnosia e apraxia, perda de memória, empobrecimento do vocabulário, dificuldade de expressão, disfunções motoras.

3- Ilusões, incontinência urinária, ataques nervosos, perda da memória a longo prazo e vocabular.

4- Fase terminal. O paciente fica completamente dependente de cuidados, quase inexpressivo e sem memória.

Nessa última fase ocorre um dos momentos mais poéticos do espetáculo - quando Guida, num momento de lucidez, se recorda da companheira pouco antes de morrer.

Destaque importantíssimo para Nice Albano, que canta como um rouxinol e fez por onde na sua primeira experiência como atriz.

Bem, agora que eu já rasguei ceda deixa eu pensar um pouco. Primeiro notei uma diferença entre Nice e Evânia no palco. Nice não atua mal nem soa falsa, mas existe algo de intangível na experiência que é sensível no palco.

Outra coisa é como cantar na personagem, dificuldade levantada por Nice no debate. Quando foi cantar as primeiras musicas realmente retirou toda a postura e partitura vocal de sua personagem para assumir o tom e posturas corretos para se cantar; mas quando foi cantar as canções de vários lugares do mundo, para relembrar Guida das viagens que elas fizeram ela assumiu uma personagem e cantou na personagem.

Sobre isso faço as seguintes considerações - 1 - É mais fácil e mais bonito atuar quando assumimos que estamos atuando, ao invés de esconder. Digo isso porque quando ela sabia que teria que fingir, assumir sotaques, posições e expressões que remetessem a diversos lugares do mundo ela fez com extrema naturalidade e simplicidade.

Isso é uma dívida psicológica que talvez nós, atores, possamos abandonar. Ser outra pessoa no palco nunca será tão bom quanto fingir ser outra pessoa, na prática e fisicamente isso não muda nada, é uma questão da mentalidade com que o ator vai a cena. Ele deve ir leve, sem nenhuma preocupação em enganar as pessoas, muito pelo contrário, o ator deve saber que vai à cena levar a verdade. Isso é muito bonito.

Nisso talvez eu faça uma ressalva ao espetáculo - por vezes eu vi um esforço das atrizes para fazer a cena, principalmente de Evânia. Entendo que faz parte da natureza do papel, difícil pela questão delicada que ele aborda; entretanto o papel pode ser evoluído ao ponto da completa naturalidade até nas partes mais tensas, até mesmo porque a personagem de Guida não faz força para ter ataques, ou esquecer e lembrar, ela já é escrava da própria loucura, portanto quanto mais natural ela soar, principalmente nos momentos de clímax, melhor.

Outro detalhe que me chamou a atenção depois foi a maquiagem de Evânia, com lápis em cima duma base pálida para marcar o rosto de velhice, é a segunda vez que vejo esse recurso, imagino que não seja nenhuma novidade, mas gosto da plástica dele.

Pronto, já pensei o que precisava. Para fechar registro que chorei, foi muito lindo, saí do teatro com aquela sensação engraçada no peito.